Capítulo 2 - Um Touro Prestes a Atacar
Para ampliarmos a sensação de suspense inserimos uma trilha para ser tocada acompanhado a leitura. (Não sejam covardes)
CLIQUE AQUI , SE TIVER CORAGEM! >>>Classic Creepypasta
Capítulo 2 - Um Touro Prestes a Atacar
Faz três anos desde a morte do meu pai, a adoção e os pesadelos. Também faz três anos desde a última vez que ouvi aquelas vozes.
Talvez meu pai não me odiasse. Talvez ele não me quisesse morto. Talvez fosse o oposto disso. Talvez ele me amasse mais do que eu posso imaginar e, por isso, se sacrificou para que as vozes finalmente morressem. Talvez ele soubesse o que estava acontecendo comigo e tudo o que acontecera naquela madrugada fosse parte de alguma espécie de ritual. Meu pai era um homem misterioso, inteligente... E as vozes nunca me quiseram muito perto dele.
Hoje é dia dez de abril, meu aniversário. Ter 16 anos não é bem o que eu esperava. Sem namorada, sem carro, sem emprego, sem grana... Mas, em compensação, tenho os dois melhores amigos do universo: Gih e Jon.
Meu pai não costumava me deixar ir à escola no dia do meu aniversário. Ele dizia algo como: "Aniversários na escola são terríveis. As crianças costumam ser cruéis." Nunca o questionei. Todos os meus aniversários se resumiram em comer lasanha de mercado sentado na mesinha de madeira da cozinha com o meu pai. Sem presentes, sem amigos, sem "Parabéns pra você". Mas sou quase um adulto agora, são novos tempos. Meus dois últimos aniversários caíram em um final de semana, foram os melhores da minha vida. Não teve uma grande festa ou um monte de gente me ligando, mas foi muito mais que uma simples lasanha.
Hoje é uma segunda-feira. É a primeira vez que vou à escola no dia do meu aniversário. Espero que nenhuma criança cruel apareça por lá. E por falar nisso...
Relógio: 6 horas da manhã.
- Merda... Já estou atrasado!
Minha rotina nos últimos três anos tem sido essa. O relógio desperta às cinco horas da manhã. Eu acordo, fico olhando para o teto exatamente por uma hora, pensando em um monte de coisas aleatórias. Quando percebo que já estou começando a ficar atrasado, eu me levanto lentamente como uma preguiça, sento-me na cama e fico lá, olhando fixamente pro que estiver na minha frente. E adivinha? Pensando em um monte de nada... De novo. Às seis e meia é quando as coisas começam a ficar um pouco desesperadoras. Começo a me mover um pouco mais rápido a caminho do primeiro alvo: O banheiro. Lá é onde eu fico me encarando enquanto escovo os dentes por quase um milênio.
Dentes escovados, hora de conferir o relógio: Sete horas. É a hora que eu penso: "Puta merda". Nessa etapa do atraso, eu já estou me movendo rápido como uma lebre, mas sem as pausas pra soneca, infelizmente. E como se não bastasse ser a etapa mais desesperadora do atraso, essa é a hora da pior parte da manhã: O banho. As manhãs costumam ser a parte mais fria do dia por aqui e adivinha? Exatamente! Sem água quente. Consegue sentir a minha dor? Aposto que sim. E depois de quase uma década dizendo pra mim mesmo: "Agora vai", "Não, não, não...", "Agora vai!". Eu finalmente encontro coragem e entro saltitante na maldita cachoeira de água fria que cai do chuveiro.
- Dentes escovados?... Confere! Banho?... Confere! Horas?... Sete e cinquenta. Fodeu!
O que nos leva a etapa final: Os vinte minutos de atraso. E é nessa fase do atraso, meus caros amigos, que a vaidade e a lógica são deixadas de lado. É a hora de correr como Forest, em Forest Gump. Tudo é esquecido, até mesmo o importante fato de que eu tenho uma bicicleta. Corre Matthew, Corre!
E então, eu finalmente chego à escola. Ofegante, descabelado, totalmente destruído. E a pior parte: A atenção. Todos olhando para mim, o cara atrasado. Mas, pelo menos chego sempre a tempo de ver o final do segundo tempo de aula, que hoje, a propósito, é de Filosofia.
Gih e Jon sempre guardam um lugar pra mim perto deles, mas não hoje. Jon achou que seria melhor sentarem longe de mim porque Gih fala demais e aparentemente, eles estão trabalhando em um tipo de festa surpresa pra mim junto com a tia Cassie e o tio Lincoln. Como já devem ter percebido, não vai ser surpresa coisa nenhuma. Gih não parava de falar do quanto meu aniversário será incrível e emocionante e Jon sempre dava beliscões nela com olhares acusadores, como um alerta de que ela estava falando demais. Às vezes, ao notarem que eu já havia chego da escola, tia Cassie e tio Lincoln pareciam duas crianças arteiras que acabaram de aprontar. Escondendo coisas debaixo da mesa da cozinha, enquanto fingiam estar falando sobre a crise do país e "o quanto o sol estava quente". Em situações como essa, a única coisa que consigo fazer é olhar como quem já sabe de tudo, sorrir e me retirar rapidamente para que possam continuar o que estão fazendo. Confesso que embora eu não fosse o maior fã de festas que existia no universo, eu meio que estava contando as horas para que aquela noite chegasse.
[...]
Era inconsciente olhar para o relógio no topo do quadro negro de dez em dez minutos. Estava louco para sair da escola e ir para a casa.
O relógio marcava cinco e meia. Já estava quase na hora que supostamente aconteceria a tal festa "surpresa". O que era engraçado e assustador, já que á dez minutos atrás o relógio marcava onze e vinte da manhã. Parecia que eu havia dado algum tipo de salto temporal, mas não me importei. Aposto que cochilei durante a tediosa explicação sobre Bháskara que a professora Vania havia dado.
Jon veio até a minha carteira e disse que precisava comprar "umas coisas" para a mãe dele depois que saíssemos da escola, e queria que eu fosse com ele. Eu resolvi entrar no jogo e aceitei ir. Gih veio logo depois de encontro a Jon e eu, dizendo que teria que resolver "umas coisinhas" em casa e depois que as resolvesse passaria em minha casa para que finalmente comemorássemos o meu aniversário juntos. Eles estavam agindo de forma suspeita. Como sempre, péssimos enroladores.
Jon era magro e um pouco mais alto que eu. Tinha pele morena e olhos um pouco maiores do que de costume. Na primeira vez em que o levei para jogar vídeo game na casa dos meus tios, tia Cassie ficou vermelha ao olhar para ele, como quem segurava o riso. Eu não entendi nada na hora e fiquei bastante desconfortável. Era a primeira vez que eu levara alguém em casa e tia Cassie ria dele disfarçadamente? O que havia de errado?
O deixei jogando sozinho no meu quarto e disse que pegaria um lanche na cozinha. Tia Cassie estava aos risos com tio Lincoln enquanto tomavam café e assistiam TV na sala de estar.
- Ei, Rigby, venha cá! – Sussurrou tia Cassie, lutando contra o riso. Não entendi porque ela me chamara de Rigby, mas fui até ela.
- Rigby? - Perguntei desconfiado. Sussurrando como ela.
- Você e o seu amigo Mordecai já conseguiram um emprego no parque? – Perguntou tio Lincoln, sussurrando aos risos.
Eu ri, ri muito. Já havia comparado Jon ao Mordecai de Apenas um Show mentalmente quando o vi pela primeira vez. Tia Cassie riu mais do que eu. Foi um ótimo dia.
Depois de dez minutos andando em círculos e passando diversas vezes pelas coisas que ele supostamente deveria comprar para a mãe dele no supermercado. Já estava claro que eu estava sendo enrolado e que logo Jon iria se oferecer para ir comigo até a minha casa. Sem comprar nada, é claro. Ele era um péssimo enrolador.
- É... Cara... Acho que aqui não vende o negócio que a minha mãe quer que eu compre. - Disse Jon, cinicamente. - Então... Vamos nessa... Podemos fazer uma maratona de Game of Thrones lá na sua casa, e... Hm... Fazer pipoca pra... É... Comemorar o seu aniversário! O que acha?
- Tá legal, Jon... - Respondi, olhando pra ele como quem sabia que tinha sido enrolado o tempo todo. Além de péssimo enrolador, era um péssimo mentiroso. -... Tá legal.
Chegando em minha casa, abri a porta da frente, entrei com Jon e, cautelosamente fui até o disjuntor da sala. Preparando-me para o susto que levaria quando todos gritassem "surpresa!" acendi a luz rapidamente. Mas ninguém gritou nada. Na verdade, a sala estava vazia. Não havia ninguém em casa. Nem mesmo um indício sequer de que haveria uma festa ali. Preparei um olhar suspeito para mandar a Jon, como quem dissesse "Que engraçado", mas ele havia sumido. Senti uma leve pontada no peito.
- Que merda é essa? – As palavras fugiram pela minha boca. Foi assustador, mas só podia ser algum tipo de jogo. - Tá legal, Jon. Vou entrar no jogo... De novo.
Comecei a caminhar atento pela sala, indo em direção à cozinha.
Às vezes, quando eu estava entediado, bem lá nos primeiros dias após a minha mudança para casa do tio Lincoln e tia Cassie, meu passatempo favorito era contar os passos que eu dava de um cômodo para o outro. Eram necessários treze passos para se chegar à cozinha a partir da porta de entrada da casa que levara direto à sala de estar. Eu havia dado dez passos quando as luzes da sala começaram a piscar até se apagarem totalmente. Vi a silhueta de um homem magro e alto com uma fantasia e uma máscara estranha que mais parecia o Frank de Donnie Darko que surgira simultaneamente com o apagar das luzes na entrada da cozinha.
Meu coração apertou, minhas pernas tremeram. Era como um dejavú. Ele me encarara como Elisa no pátio da escola. Estava escuro, não conseguia ter uma visão clara dele. A única iluminação que havia ali era a do luar que invadia a entrada da cozinha por uma janela da sala cujas cortinas estavam abertas. Eu estava a três passos de distância dele. Tudo o que eu conseguia ouvir era o som alto de sua respiração abafada. Era como se por trás da máscara houvesse alguém bufando de ódio, como um touro prestes a atacar.
Correr ou permanecer imóvel? Perguntei-me isso mil vezes antes de sentir um ar quente em minha nuca. Havia alguém atrás de mim e este alguém sabia o meu nome.
- Matthew... - Sussurrou por trás de meu ouvido. Meu corpo congelou. Era uma voz familiar, parecia uma criança. Eu já a ouvi antes, mas onde e quando?... Quem era?
Virei-me rapidamente e tudo o que vi foi a escuridão da sala de estar. Não havia ninguém ali. Tudo ficou silencioso e por um segundo eu me esqueci do homem que estava parado na entrada da cozinha. Até que ele fez um movimento.
Voltei minha atenção para a entrada da cozinha. Ele havia sumido. O som da sua respiração de touro foi substituído pelo som de passos corridos somados ao estalar do chão de madeira da cozinha.
- Socorro, Matthew! - Ouvi tia Cassie gritar. Senti-me como em meus pesadelos. Aquele terror, aquela injeção de adrenalina. Nem precisei de três passos, um salto foi o suficiente. Eu só parei de correr quando bati de frente com a cadeira da mesa de jantar. As luzes se acenderam. Havia um bolo branco em cima da mesa com os dizeres em vermelho: "Feliz Aniversário, Rôn". O homem estranho estava parado em minha frente do outro lado da mesa, mas tinha algo diferente nele agora. Havia uma faca grande em suas mãos.
Eu estava ofegante e trêmulo, olhando fixamente pra os olhos negros de sua máscara. Ele deu um passo à frente com a faca em mãos e eu dei um passo para trás. Bati minhas costas em algo quente que bufava como um touro. Olhei para trás. Era o homem mascarado que antes estava na entrada da cozinha. Ele também tinha uma faca em mãos. Dei um salto para trás e esbarrei no homem que antes estava a minha frente. As luzes piscaram freneticamente. Tudo ficou escuro por dois segundos e quando a luz se acendeu novamente, eu estava cercado. Eram seis homens mascarados fazendo um circulo em minha volta. Todos com facas em mãos. Eu olhei para cada um deles girando no meio do círculo, desesperado.
Por alguma razão, meus olhos se fixaram naquele que antes estava do outro lado da mesa. Finalmente conseguia ver seus olhos na escuridão da máscara. Já vi aqueles olhos antes. Estava tão perdido neles que não notei quando o homem deu um passo em minha direção e me apunhalou no estômago com a faca. Os outros cinco mascarados se aproximaram e me apunhalaram freneticamente em toda parte. Em cada centímetro do meu torso. Meus olhos continuavam fixos nele. Minha visão estava embaçando. Já não sentia mais a dor das facadas. Cai no chão com os olhos grudados no homem. Meus olhos foram se fechando. O homem começou a tirar a máscara. Lutei para manter meus olhos abertos para ver seu rosto.
- Pa... Pai?!- Tentei dizer, mas minha voz morreu antes que as palavras pudessem ser ditas. Tudo ficou preto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário